A rua da infância se vestiu de Brasil para esperar o futebol. Há bandeirolas de uma ponta à outra, bandeiras em tubos plásticos, cal auriverde nas calçadas. Há meninos que desfilam camisas de times, e tudo nos saúda o movimento bonito do bairro familiar. A gente atravessa a rua sabendo que somos distintos, pois não há outra rua Helena como a nossa, a minha.
Na infância de fogueira em junho, de pipoca e quentão. A mobilização, a caça de bambu longe. Um dia eu fui. Chegavam os homens, os velhos e moços na rua, trançavam entre postes a festa junina. O Zico, o bar, suas filhas, meu pai, o entusiasmo de mim, tão tímido, e das crianças.
Eu quero esse verde-amarelo das periferias na minha alma de triste. Eu quero entregar tudo ao não-sentido da paixão de um movimento de campo. Eu que não sei jogar, nem dançar, pois nasci com os pés muito cavados, pernas confusas e nenhum jogo de cintura. Eu nunca soube idolatrar esses rapazes de chuteira fora do tempo da Copa. Ainda assim, eu quero pertencer a tudo isso, ao movimento pró-Brasil da minha rua, a essa coisa meio ingênua de bairro que nunca perdi, pois sou, sempre serei isso e todas as outras coisas estando aqui ou fora.
Com ou sem Copa, eu não quero nunca me perder de mim. Troco talheres, corro para pegar o ônibus que lá vai, acho da maior dignidade o catador de papel, bebo média no tiozinho da esquina. Há muito eu me fiz digno demais para falsear a vida, fazer demasiado gênero para parecer bonito. Gosto da verdade ingênua espelhada no verde-amarelo das calçadas, o naif da vida sem neon ou ópio. E para os que acham esse clima de Copa ou futebol mera alienação, eu sou pela inconsciência, o transe feliz não ponderado, o samba-exaltação. Eu ando mesmo é desejoso do gol.
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